9.3.08

Economia brasileira baseada em teoria romena

Leia abaixo fragmento de entrevista do professor americano Joseph L. Love, do Departamento de História da Universidade de Illinois e diretor do Centro de Estudos Latino-Americanos e do Caribe, autor de A construção do Terceiro Mundo: teorizando o subdesenvolvimento na Romênia e no Brasil (Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1998), concedida em 28 de junho de 2001 a Flávio Madureira Heinz, em que aborda seu estudo que comprova a influência das teorias econômicas e políticas do romeno Mihail Manoilescu (foto) no Brasil de Getúlio Vargas.

Dos estudos sobre regionalismo brasileiro, o senhor migrou, nos anos 1980, para a área de história econômica. Como se deu essa transição?
Eu não queria passar toda a minha carreira num assunto, e tinha um background na economia. Enquanto trabalhava no livro sobre São Paulo, descobri que houve um teórico romeno, Mihail Manoilescu, muito difundido no Brasil nos círculos empresariais das décadas de 1930 e 1940 – seu defensor mais importante foi Roberto Simonsen, em São Paulo –, cujo livro, Teoria do protecionismo e de permuta internacional (1931), fora publicado pela FIESP. Passei a estudar outras obras dele e descobri que havia uma tradição de estudos econômicos, de várias escolas econômicas, muito rica na Romênia. Depois comecei a estudar a língua romena e em 1981-82 passei algum tempo em Bucareste, para fazer um estudo paralelo com o Brasil, para ver como fora teorizado o problema do subdesenvolvimento em duas áreas que podemos chamar de Terceiro Mundo.

No período entre as duas guerras mundiais, a Europa Oriental foi o berço dos primeiros teóricos do desenvolvimento econômico. Aqueles países – a Polônia, por exemplo – tinham o problema de um campesinato enorme, baixos níveis de alfabetização, e tinham o objetivo de criar um novo Estado, todos problemas de Terceiro Mundo. Foi por isso que os primeiros teóricos do subdesenvolvimento nasceram e fizeram os seus primeiros estudos, inclusive Manoilescu, que foi importante na Romênia. Houve também uma escola marxista muito rica, a escola populista e neopopulista, que teve depois uma expressão no Brasil na década de 1970, quando os cientistas sociais descobriram o problema dos camponeses na Amazônia, da possibilidade de o camponês se opor ao capitalismo no campo.

Chaianov, teórico russo que escreveu em russo e alemão, era conhecido na Romênia desde 1925 e foi descoberto na América Latina em fins da década de 1960. Foi somente na década de 1970 que os cientistas sociais no Brasil usaram as teorias dele para estudar o problema brasileiro. Portanto, é interessante a comparação entre o que chamamos em inglês leads and lags, o porquê de os romenos terem descoberto essas teorias antes dos brasileiros e dos latino-americanos. O marxismo foi muito desenvolvido , o populismo clássico teve uma expressão na Romênia, pelas correntes de imigrantes russos, mas não teve nenhuma expressão na América Latina antes da Primeira Guerra Mundial. antes da Grande Guerra, na Romênia, surgiram teorias de dependência saindo de uma tradição marxista. Tentei comparar o processo de desenvolvimento da teoria marxista e outras maneiras de pensar o problema do desenvolvimento no Brasil e na Romênia. Todas as escolas foram réplicas da escola neoclássica (associada ao liberalismo). Então, acho que se pode aprender muito fazendo um estudo comparado entre dois países. Às vezes, o que se observa não é uma influência direta de Manoilescu em Furtado ou Prebisch, por exemplo, mas uma redescoberta independente de teorias e proposições muito parecidas.

Isso é interessante, pois não creio que se imaginaria normalmente no Brasil uma comparação com a Romênia. A estratégia em geral é comparar o Brasil com outros países latino-americanos ou com outras potências regionais, como a Índia, em sua posição no sul da Ásia, ou a China, no Extremo-Oriente.
No início do meu livro sobre a Romênia e o Brasil, ponho em evidência as grandes diferenças nos meios social, geográfico e político dos dois países. Ainda assim, há pontos em comum. Por isso os escolhi como representantes da América Latina e da Europa Oriental, respectivamente. Estudei a Europa Oriental e a Romênia principalmente no período que vai de 1880 até o fim da Segunda Guerra Mundial – quando começou um período muito rígido do stalinismo –, e o Brasil, da década de 1930 – com as primeiras ondas de industrializaçãoaté os anos 1980.

Fonte: Revista Estudos Históricos do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getúlio Vargas

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