Leia abaixo fragmento de entrevista do professor americano Joseph L. Love, do Departamento de História da Universidade de Illinois e diretor do Centro de Estudos Latino-Americanos e do Caribe, autor de A construção do Terceiro Mundo : teorizando o subdesenvolvimento na Romênia e no Brasil (Rio de Janeiro , Paz e Terra , 1998), concedida em 28 de junho de 2001 a Flávio Madureira Heinz, em que aborda seu estudo que comprova a influência das teorias econômicas e políticas do romeno Mihail Manoilescu (foto) no Brasil de Getúlio Vargas.
Dos estudos sobre regionalismo brasileiro , o senhor migrou, nos anos 1980, para a área de história econômica . Como se deu essa transição ?
Eu não queria passar toda a minha carreira num só assunto , e tinha um background na economia . Enquanto trabalhava no livro sobre São Paulo , descobri que houve um teórico romeno , Mihail Manoilescu, muito difundido no Brasil nos círculos empresariais das décadas de 1930 e 1940 – seu defensor mais importante foi Roberto Simonsen, em São Paulo –, cujo livro , Teoria do protecionismo e de permuta internacional (1931), fora publicado pela FIESP. Passei a estudar outras obras dele e descobri que havia uma tradição de estudos econômicos , de várias escolas econômicas, muito rica na Romênia. Depois comecei a estudar a língua romena e em 1981-82 passei algum tempo em Bucareste, para fazer um estudo paralelo com o Brasil, para ver como fora teorizado o problema do subdesenvolvimento em duas áreas que podemos chamar de Terceiro Mundo .
No período entre as duas guerras mundiais, a Europa Oriental foi o berço dos primeiros teóricos do desenvolvimento econômico . Aqueles países – a Polônia , por exemplo – tinham o problema de um campesinato enorme , baixos níveis de alfabetização, e tinham o objetivo de criar um novo Estado , todos problemas de Terceiro Mundo . Foi por isso que os primeiros teóricos do subdesenvolvimento nasceram lá e lá fizeram os seus primeiros estudos , inclusive Manoilescu, que foi importante na Romênia. Houve também uma escola marxista muito rica , a escola populista e neopopulista, que teve depois uma expressão no Brasil na década de 1970, quando os cientistas sociais descobriram o problema dos camponeses na Amazônia, da possibilidade de o camponês se opor ao capitalismo no campo .
Chaianov, teórico russo que escreveu em russo e alemão , era conhecido na Romênia desde 1925 e foi descoberto na América Latina em fins da década de 1960. Foi somente na década de 1970 que os cientistas sociais no Brasil usaram as teorias dele para estudar o problema brasileiro . Portanto , é interessante a comparação entre o que chamamos em inglês leads and lags, o porquê de os romenos terem descoberto essas teorias antes dos brasileiros e dos latino-americanos . O marxismo foi muito desenvolvido lá , o populismo clássico teve uma expressão na Romênia, pelas correntes de imigrantes russos, mas não teve nenhuma expressão na América Latina antes da Primeira Guerra Mundial. Já antes da Grande Guerra , na Romênia, surgiram teorias de dependência saindo de uma tradição marxista . Tentei comparar o processo de desenvolvimento da teoria marxista e outras maneiras de pensar o problema do desenvolvimento no Brasil e na Romênia. Todas as escolas foram réplicas da escola neoclássica (associada ao liberalismo ). Então , acho que se pode aprender muito fazendo um estudo comparado entre dois países . Às vezes , o que se observa não é uma influência direta de Manoilescu em Furtado ou Prebisch, por exemplo , mas uma redescoberta independente de teorias e proposições muito parecidas.
Isso é interessante, pois não creio que se imaginaria normalmente no Brasil uma comparação com a Romênia. A estratégia em geral é comparar o Brasil com outros países latino-americanos ou com outras potências regionais , como a Índia , em sua posição no sul da Ásia, ou a China, no Extremo-Oriente.
No início do meu livro sobre a Romênia e o Brasil, ponho em evidência as grandes diferenças nos meios social , geográfico e político dos dois países . Ainda assim , há pontos em comum . Por isso os escolhi como representantes da América Latina e da Europa Oriental , respectivamente . Estudei a Europa Oriental e a Romênia principalmente no período que vai de 1880 até o fim da Segunda Guerra Mundial – quando começou um período muito rígido do stalinismo –, e o Brasil, da década de 1930 – com as primeiras ondas de industrialização – até os anos 1980.
Fonte : Revista Estudos Históricos do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getúlio Vargas
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